sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

O Nunes

Lembro-me bem do tempo em que trabalhei como operário não qualificado numa fábrica de componentes automóveis. Na altura ainda havia encomendas da França e da Espanha e tudo corria sobre rodas (ou não fossem peças para carros). As encomendas chegavam e sobejavam para pagar os salários dos cento e tal funcionários da altura. No meu departamento éramos vinte e três e o nosso chefe era o Nunes.
Tínhamos uma relação porreira com o Nunes. Às vezes os quadros mínimos têm atritos e embirrações com os quadros médios, mas com o Nunes estava-se bem. Já se sabe que de manhã o corpo pede caminha, por isso era raro a rapaziada entrar ao serviço às 9h00 como estava no contrato. Entrávamos às 9h30, pousávamos o kispo nas costas da cadeira, saíamos para a bica, voltávamos às 10h, passávamos os olhos pelas gordas d’A Bola e lá para as 10h30 começávamos a trabalhar. Saíamos para almoçar ao meio-dia e meia, conversa puxa conversa, “é só mais meio uísquezinho pra saída” e às 15h00 voltávamos. Teoricamente a saída era às 18h, mas a malta geralmente saía antes derivado à hora a que passava a carreira. Ou então nem aparecia à tarde “para ir ao médico”. Bolas, no último ano que lá estive o Gameiro deve ter ido umas 56 vezes ao dentista! E olhem que o Gameiro tinha uns belos dentes. Tanto um como o outro.
No meio disto tudo, o Nunes não via ou fingia que não via. Era um gajo às direitas. Nunca se chateou com o pessoal e as coisas seguiam normalmente. Entrava à hora certa, saía à hora certa, mantinha a Administração quietinha, nunca apresentava resultados fabulosos, mas também nunca comprometeu. Era um gajo porreiro, o Nunes.
Lembrei-me destes bons velhos tempos, porque acabo de ler que o temível defesa do Sporting Pedro Silva diz que “todos querem que Paulo Bento continue”.
Claro que querem, Pedro Silva. Lá na fábrica nós também queríamos todos que o Nunes continuasse. Aliás, no dia em que a a Administração correu com ele foi uma chatice. Chegou um tipo novo com estudos e em menos de um fósforo metade do departamento foi posto no olho da rua. E diz que agora se fartam de trabalhar…
De vez em quando ainda lá vou almoçar com os que ficaram. Mas tem que ser a correr porque eles entram às duas. Eu sou o único que bebe meio uísque.
Do Nunes, nunca mais ninguém ouviu falar.

16 comentários:

Anônimo disse...

Também trabalhei aí, e lembro-me bem do Nunes, bons tempos.
Ouvi dizer que o Nunes agora faz comentário para um blog.


xinfrim

Anônimo disse...

O Nunes foi central dos lampiões. Não era grande espingarda.. na fábrica era mais desenvolto. Para quando uma história do sapateiro Pietra?

Ian

herlander disse...

Já esse Pedro Silva nem para acartar sacas de cimento lá na fábrica serve...

JNF disse...

Deixa que eu acabo a história:

Entretanto, o Nunes farto da vida muito tranquila que levava em Portugal decidiu emigrar para Espanha. Desta vez não foi trabalhar para a indústria dos automóveis: foi para a aeronáutica Atlética de Madrid. Lá encontrou outros trabalhadores que estiveram em Portugal, nomeadamente os senhores Sabrosa, Ribeiro, Assunção e até um grego que estava em situação ilegal, o Giourkas. Aí, o Nunes desenvolveu capacidades de liderança fruto da experiência acumulada durante os anos que passou em Espanha, mas um dia, o Nunes acabou por querer sair. Achava que estava na altura de voltar a casa. Então resolveu aceitar a proposta da fábrica de aviões topo de gama (isto existe?), que se situava relativamente perto da fábrica dos automóveis onde tinha trabalhado. Na nova fábrica, obteve os melhores resultados possíveis, e aí os adeptos da fábrica de automóveis rogaram pragas eternas ao ex-chefe.


Isto passou-se mais ou menos com Simão Sabrosa, quem sabe um dia se acontece o mesmo com o Bento

Anônimo disse...

ACORDEM PA

O PROBLEMA NÃO É DO PAULO BENTO!

AINDA O VAIS VER NO PORTO A GANHAR CAMPEONATOS E AÍ KERO VER O NUNES A RIR

FORÇA PAULO, SPORTING CAMPEÃO !

Anônimo disse...

Ás 10,30 começavas isso era orário de bancário e tu fazias esse orário?então devias ser um grande engraxador,porque orários desses são pra graxas ou xulos

Anônimo disse...

Este gajo dos erros é o máior carago!! Diz mal de tudo e tódos más á cúlpa é do vále e azévedo!! xulos pá.

Anônimo disse...

A história está engraçada, bem escrita e com o humor do costume, mas, lamentavelmente, até provoca torcicolos de tanto torcer e retorcer para que a fábula tenha uma moral que se adapte ao Paulo Bento.

O lamentavelmenete tem a ver com o facto de ter todo o gosto em concordar com o 7. Desta vez não dá. Não sei fazer o pino.

Anônimo disse...

Ó 7, trabalhar numa fábrica, entrar às 9h30, ir a seguir beber a bica, ler a bola, beber meio whiskey ao almoço, sair à 15h... mas tu já foste benfiquista??

Anônimo disse...

Caro 7, como eu te compreendo... tb tive a sorte de trabalhar no torno mecânico sob a chefia do grande Nunes.

A questão é que mais 1/2 uisque, menos 1/2 uisque, mais ou menos idas ao dentista, quando era preciso o Nunes dava voz de comando e, naquela fábrica, fazia-se do melhor que havia na indústial automóvel (em portugal e no mundo). De vez em quando fazia-se gazeta, mas suava-se a camisola com dedicação e vontade, sem nunca envergonhar chefias e colegas.

Ao Paulo Bento e aos seus actuais players teria feito muito bem uma pré-época sob a batuta do Nunes...

Grande abraço,
shoarma

Anônimo disse...

Andas a dormir, o Nunes emigrou para uma fabrica de ponta em Manchester, mas tornou-se ambicioso e dizem que esta de volta a Portugal
Abcs
REXIMPERATOR

Anônimo disse...

És pior que o Cartaxana nas suas diarreias mentais que escreve no Record

O 7 Maldito disse...

Caro anónimo: ao fim de 2 anos a escrever nesta "casa", finalmente há alguém que me elogia condignamente! Obrigado. Se há coisa para que trabalho é para um dia vir a ser pior que o Cartaxana nas suas diarreias mentais.
Aparentemente, já consegui!

Shoarma, estás a confundir o Nunes com o Neves, da altura em que trabalhámos na firma de artes gráficas, pá. Embora houvesse claras semelhanças, o Neves era um dos nossos. E com mais ou menos uísque trabalhava-se bem.
O Nunes era o da risca ao meio, que não fazia nem deixava fazer.

Abraços a ambos os dois

Bulhão Pato disse...

Muito bom, Sete. Não concordo particularmente com a moral da história, mas ri-me a valer.

Abraço

Repórter H disse...

Muito bom post. O comentário do anónimo das 12:41 também está bem.

Anônimo disse...

És um adepto foleiro mas escrevinhas que nem um gato!
Bom post. Gostei particularmente do Kispo, que saudades!
Ass: Grandemestre