Trauma de infância

A intenção era boa: de uma assentada não participava na tão falada “crise de militância” e contribuía para a conversão de duas criancinhas ao sportinguismo praticante. Na impossibilidade de ir a Alvalade na noite de Sábado, cedi os meus cartões a uma colega do serviço, que levou os seus dois rebentos de 7 e 9 anos à bola pela primeira vez.
A coisa até deve ter começado bem, porque meia hora antes do apito inicial recebi uma foto dos petizes de cachecol ao pescoço, bem lambuzadinhos de ketchup e batata palha de cachorro. Felizes, portanto. Achei que a minha missão estava a ser cumprida e que daí a uns anos os meninos estariam a comprar a sua primeira Gamebox, mesmo a tempo de assistir ao jogo de despedida dos relvados do Daniel Carriço.
Depois, foi o que se viu e o líder ganhou sem contestação.
Ora, nós os adultos sabemos bem o efeito que estas experiências traumáticas podem ter no desenvolvimento das crianças. Por isso, hoje sinto-me culpado. Temo que os gaiatos se desviem dos bons caminhos, que eventualmente sigam os conselhos de um falso amigo e experimentem o benfiquismo. E o pior é a primeira vez. Depois, dizem que têm a coisa controlada mas continuam a dar-lhe. Os efeitos fazem-se sentir pouco tempo depois: à inicial sensação de prazer e euforia segue-se o embrutecimento, os distúrbios de personalidade, as dificuldades em sociabilizar e a cada vez menor integração na sociedade. Surgem os problemas em arranjar ou manter emprego e as crises familiares, dando-se início a uma espiral descendente pela via da marginalidade.
Se daqui a dez ou quinze anos os rapazinhos fizerem parte dos No Name Boys e forem detidos numa mega-operação policial por posse de drogas, tochas incendiárias e sabe-se lá mais o quê, já sabem de quem é a culpa. Do Paulo Bento, claro!